Nosce te Ipsum

"Um quadro só vive para quem o olha" - Pablo Picasso

(Nosce te Ipsum)

sábado, 13 de agosto de 2011

"Daniel e o Bloco de Imagem"






Daniel e o Bloco de Imagem




A noite dormiu, a cafeteria fechou. A insônia acordada no coração de quem muito pensa faz da cabeça um terreno de dores, onde a noite não dorme.


So close no matter how far

Couldn't be much more from the heart

Forever trusting who we are

And nothing else matters


Metálico deveria ser o coração de quem ama, assim a cada suspiro se morresse de verdade na ferrugem. Era Metallica tocando num barzinho de roqueiros ao lado de um motel de slogan “Santificado seja o pecado”.

Muita coisa da minha cabeça evapora como as palavras daqueles bêbados, mas é certo que aquilo não se dissiparia, era um bloco duro de imagens sendo arremessado na minha cabeça pelos meus olhos.

“A Santa”


Never opened myself this way

Life is ours, we live it our way

All these words I don't just say


Ela levava todo o meu encanto naquela moto junto de um desconhecido saindo do motel. O sorriso largo dela me aterrorizou feito um papa sanguinário me sorrindo. Não! Gritei para o concreto duro que era a imagem, e ele só me respondeu com inchaços na mente. Não! E eu que disse que confiava... Como? Como?! Precisava fazer algo... Havia falado com o namorado dela, meu amigo... Senti tanto por mim, quanto por ele, quem eu praticamente expurgava da minha cabeça, aquele quem eu não concebia a imagem agora me era um companheiro por quem tinha compaixão. Por um momento senti como se a dividisse com ele, e sem desenganos ou sofrimentos; sentimentos estranhos insurgiram em mim.


Trust I seek and I find in you

Every day for us something new

Open mind for a different view

And nothing else matters


- Eu gosto disso! Sim! Você... Não deveria ter visto isso, Daniel!

O tempo me parecia meio distorcido, não compreendi, ou vi sua passagem, entre o momento em que tive o choque da imagem e o que comecei a falar com a “santa”. Quase um piloto-automático, as minhas pernas e a minha boca apenas faziam, as minhas palavras eram tão inseguras para mim quanto o meu próprio ser para elas. Um mundo inteiro se destruía em mim enquanto escutava as palavras dela em tons de borbulhar de gêiseres.

- Não diga... Por favor, ele não vai entender, vivemos tão bem...


Never cared for what they do

Never cared for what they know

But I know


Ainda ouvi, antes do “por favor”, coisas como “Não, não é o que você está pensando”, um clichê antes de me confessar a verdade, a negação do que é de fato... Quando me disse isso, pensei o quanto da minha mente de fato é uma negação da realidade. O quanto da mente de todos nós é a negação da realidade? “Sim... eu o traio”, enfim me confessou, depois de algumas coisas que eu disse, mesmo não entendendo bem que o havia feito. Eu precisava saber o porquê, e seria consumido por mim mesmo se não o perguntasse.

- Eu o amo. Sim, Daniel, embora você não entenda, eu amo meu namorado. Sim, eu o desejo, eu o quero, sonho e planejo. Mas... Mas...

A vida é uma bomba relógio que se explode a cada palavra solta no ar, cada sílaba é a fagulha para a destruição de alguém. O quanto do meu dizer constrói, e o quanto do meu dizer destrói? Sentia-me completamente destruído a cada sílaba, mas elas me construíam de alguma forma, não sei bem. Então...

- Mas... Eu sinto outros desejos... Talvez não me sentisse satisfeita, não me sentisse completa, faltava-me algo... E eu me sinto assim com outras pessoas também. Eu amo outras pessoas também, Daniel. Mas não deixo de amá-lo por isso...

A vontade avassaladora, e perversa, de perguntar por que não me amava, então, já que saia com outros homens, era imensurável, mas não o poderia fazer, por algum juízo de valor da minha cabeça, talvez Deus estivesse olhando por mim, assim eu esperava, Ó Deus, olhe e me guie a cada instante das minhas tempestades.

- E antes que pergunte, não aceitei o seu beijo porque você é bem próximo dele, de nós. Isso poderia estragar tudo...

Era pecaminoso? Era nojento? Era inescrupuloso? Mas eu senti um alivio tremendo por ela ter dito aquilo, além de esperança, embora não tenha aceitado que pudesse sentir aquilo, sim! Ah! Deus, por favor, me julgue! Senti esperanças por saber que não foi porque ela “não me amava”, mas porque ela “não poderia me amar”.

- E também porque não sinto desejo para isso... Não sinto amor assim por você, o que sinto por você é diferente Daniel. Amo outras pessoas... Não me condene... Não me julgue. O amor é tão pequeno que não podemos amar outras pessoas?

O templo que há em mim desmoronou, e fiquei pensando que por muito tempo a chamava de santa, incorruptível... A imagem, o bloco, se desmanchava aos poucos. E mais que Deus, eu a julgava, condenava-a. Ela confessou tudo, depois de uma longa conversa, de muitos interlúdios, mas isso era a única coisa que a minha cabeça conseguia absorver no momento.


Never cared for what they say

Never cared for games they play

Never cared for what they do

Never cared for what they know

And I know, yeah


So close no matter how far

Couldn't be much more from the heart

Forever trusting who we are

And nothing else matters


Ela seguiu seu caminho, não conseguia mais vê-la como santa, e imaginei que meu amigo, o namorado dela, será que aconteceria o mesmo com ele? Mas fiquei na navalha do que fazer, disse para ela que não diria nada a ele, e disse a ele que diria tudo que soubesse. Quis apenas ser julgado por Deus. Aceitaria tudo.

Agora deito, vejo o teto, e a música continua desabando na escuridão. Não consigo imaginar mais de um objeto no amor, não consigo entendê-la. “O amor é tão pequeno que não podemos amar outras pessoas?” Era o que ela havia dito. O amor é tão pequeno que só tem um objeto de amor? Eu pensava.

Estava certo que precisava partir, como disse André. Eu não sei o que sinto, não sei se algum dia saberei. E...
And Nothing else metters...



(Por Marcos P. S. Caetano)


Fortaleza, 21h52 de 27 de Fevereiro de 2011


Série Daniel Riva:

Arma de Caça na Cabeça de Daniel Riva
Daniel Riva na Promoção da Semana

A Cara Valente de Daniel Riva

Daniel, Cada um é seu próprio escarro


Please, Daniel, isso é um bom conselho

Daniel Riva entre a Traição e a Esperança


Daniel Riva e os Exércitos de Escarro



Desenho: Francisco Goya, Arrependimento.


Palavra da Vez

imagem

s. f.

1. Representação de pessoa ou coisa.

2. Figura ou efígie de um santo, da Virgem ou de Cristo.
3. Semelhança.
4. Representação (no espírito) de uma ideia.
5. [Informal] Pessoa formosa.
6. [Gramática] Metáfora.

4 comentários:

  1. E pra quem ama muito,muito intensamente teria um tempo assim tão presente, tão momentaneo para amar da mesma maneira outras pessoas?
    Que tipo de amor é este, senão desejo?
    "O amor é tão pequeno que só tem um objeto de amor?"
    Não é o amor tão grande que abraça o respeito, a lealdade, a fidelidade e o único e imperfeito objeto?

    Bom demais te ler,rapaz!
    Bjo!

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  2. Comecei a gostar de rock com Nirvana e Metallica... Essa semana o Black Album fez 20 anos... Deu vontade de ouvir depois desse post...

    Caetano, macho véi, dificil te ver por aí... como poderemos manter contato?
    meu email: zeto1560@hotmail.com
    tem face, tuiter?

    Abraço!

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  3. Que dificuldade! se eu fosse Daniel já tinha mandado tudo pra puta que pariu... mentira hehee
    Nunca ouvi muito Metallica, mas essa música é boa, lembra minha infância ou sei lá!
    grande abraço!!

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  4. "A vida é uma bomba relógio que se explode a cada palavra solta no ar, cada sílaba é a fagulha para a destruição de alguém. O quanto do meu dizer constrói, e o quanto do meu dizer destrói?"

    fantástico. como consegue?

    já viu a shakira cantando? gostei bastante.
    http://www.youtube.com/watch?v=E3L1HEsQo1I

    beijo/abraço

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